GRAMATICAIS. Leitores regulares de jornais certamente estão acostumados a encontrar o substantivo “gigante” na designação de uma grande empresa, em geral a mais importante ou uma das maiores de um ramo de atividades.
Alguns exemplos, extraídos de várias publicações, ilustram esse uso: “a gigante da computação em nuvem” (Amazon), “a gigante de buscas” (Google), “a gigante de tecnologia e meios de pagamento” (Mastercard), “a gigante russa de gás” (Gazprom), “a gigante do alumínio” (Rusal), “a gigante do comércio eletrônico” (Amazon), “a gigante chinesa do setor imobiliário” (Evergrande), “a gigante americana Apple”, “a gigante do streaming” (Netflix), “a gigante russa dos diamantes” (Alrosa), “a gigante petrolífera Rosneft”, “a gigante de tecnologia Meta”, “a gigante brasileira de petróleo” (Petrobras)…
A insistência no uso da construção sugere que estejamos diante de um modismo, como já o foram, em outros tempos, “a novela” ou o “fantasma” disto ou daquilo. Quem ainda se lembra da “novela da reforma da Previdência” ou do “fantasma da inflação”?
Um parêntesis: modismos e lugares-comuns são comuns nos textos da imprensa, em geral produzidos em ritmo acelerado. Embora pareçam simples falta de criatividade, são eficazes do ponto de vista da comunicação rápida exatamente por serem repetitivos e acionarem de imediato uma ideia conhecida por muita gente. Esse é um tema que deixo para outro dia. Voltemos ao “gigante”.
Quem for observador terá notado o artigo “a” que antecedeu a palavra “gigante” em todos os exemplos arrolados acima. Há também exemplos em que “gigante” é antecedido de “o”: “o gigante chinês do e-commerce” (Ali Express), “o gigante americano do streaming” (Netflix), “o gigante asiático” (China), “o gigante da entrega de comida” (iFood), “o gigante chinês das redes sociais” (TikTok) etc. Afinal, gigante é um substantivo masculino, feminino ou comum de dois gêneros?
Acertou quem respondeu “masculino”. Dizemos, corretamente, “o gigante”. Por que, então, tantas vezes o termo tem aparecido no feminino? É provável que a escolha decorra de associação à ideia de empresa (empresa gigante). O termo, quando usado como adjetivo, pode caracterizar seres masculinos ou femininos (prédio gigante/ escola gigante). Nesse sentido, é sinônimo de “gigantesco” ou “gigantesca”. O substantivo composto “roda-gigante”, por exemplo, é formado de dois elementos que, separadamente, são substantivo (roda) e adjetivo (gigante); nesse caso, o gênero do composto é dado pelo substantivo, que é feminino (uma roda-gigante).
Como substantivo, no entanto, “gigante” é masculino, portanto deve ser antecedido do artigo “o”. Embora seja pouco usado hoje, o substantivo feminino “giganta” existe. Importa notar que, quando dizemos “prédio gigante”, o substantivo “prédio” é que é determinado por artigo (o prédio gigante, um prédio gigante) e, quando dizemos “escola gigante”, o substantivo “escola” é que é determinado por artigo (a escola gigante, uma escola gigante). O mesmo vale, por exemplo, para a construção “a gigante Alcione emocionou o público”, em que o artigo feminino determina o substantivo “Alcione” e “gigante” é, naturalmente, um adjetivo.
Se for substantivo, “gigante” será masculino, portanto o gigante da tecnologia, o gigante do petróleo, o gigante do streaming etc. Os jornalistas, que estão sempre a usar o substantivo “gigante”, devem ficar atentos ao gênero do substantivo.
superinteressante.
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