“Avalia ela”: pronomes do caso reto e do caso oblíquo

GRAMATICAIS. Na linguagem informal brasileira, os pronomes pessoais do caso reto têm aparecido na posição de objeto. Isso ocorre em frases do tipo “encontrei ela ontem”, “convidou nós”, “trouxe eu junto com ela” etc., que, embora típicas do registro informal, já vêm aparecendo nos textos da imprensa brasileira com alguma frequência. Vejamos um exemplo, extraído de uma entrevista publicada em um grande jornal:

Um dos temas de que você trata no livro é a regulação. Como avalia ela hoje no Brasil?

O português manteve nos pronomes pessoais, como herança do latim, a mudança de “caso”. Isso quer dizer, grosso modo, que a palavra sofre alterações formais de acordo com a sua função sintática (alterações semelhantes às da conjugação dos verbos, cuja terminação muda para exprimir tempo, modo, pessoa e número). 

É por causa dessa herança que, no “sujeito”, usamos “eu” (“Eu fiz isto”), mas, no objeto direto, esse “eu” vira “me” (“O professor me disse algo”) e, no objeto indireto, “a mim” (“O professor disse algo a mim”). Na primeira e na segunda pessoa (do singular e do plural), as formas oblíquas servem tanto para o objeto direto quanto para o objeto indireto (em “Ele me viu”, “me” é objeto direto; em “Ele me disse”, “me” é objeto indireto), mas, nas terceiras pessoas, há formas diferentes para objeto direto (“o”, “a”, “os”, “as”) e para objeto indireto (“lhe”, “lhes”). 

Na frase em questão, como “avaliar” é transitivo direto (avaliar alguma coisa, no caso, “avaliar a regulação”), seu complemento seria um dos pronomes de objeto direto. Como  deve retomar o termo “regulação” (feminino singular), esse pronome é o “a”. Assim:   

Um dos temas de que você trata no livro é a regulação. Como a avalia hoje no Brasil?

Pode até ser que estejamos caminhando para uma mudança linguística, coisa que pesquisadores podem determinar com mais precisão, mas, por ora, pelo menos na norma culta, pronomes do caso reto não devem ocupar a posição de objeto. 

Publicado por Thais Nicoleti

Thaís Nicoleti é formada em português e linguística pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP e licenciada pela Faculdade de Educação da mesma universidade.

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