“Caso” e “acaso”

GRAMATICAIS. O autor de uma newsletter, muito interessante por sinal, precisou redigir um aviso aos seus leitores que não conseguiam receber o material. Ao elaboar a mensagem, fez uma confusão que é bastante comum no uso cotidiano do português. Vejamos:

Alguns leitores têm relatado que as primeiras edições da newsletter são desviadas para a aba “Promoções” (ou “Promotions” na versão americana). Acaso não encontre a edição em sua caixa de entrada, após confirmação da assinatura, procure lá. É provavelmente onde está.

Vemos uma confusão entre duas palavras parecidas, “caso” e “acaso”. “Caso” (um caso sério, um caso de polícia, um caso de amor, um caso de Covid-19), além de ser um substantivo, é uma conjunção subordinativa condicional, equivalente a “se”.

Carlos Drummond de Andrade, em seu famoso Poema de Sete Faces, diz:

Mundo mundo vasto mundo, Se eu me chamasse Raimundo/ seria uma rima, não seria uma solução/ Mundo mundo vasto mundo,/ mais vasto é meu coração.

No lugar do “se”, poderia ter usado “caso” sem prejuízo de sentido: “caso eu me chamasse Raimundo”. “Acaso”, por sua vez, pode ser um substantivo, que nomeia uma ocorrência incerta ou fortuita (O acaso nos uniu; Aquilo foi obra do acaso), ou mesmo um advérbio de dúvida, equivalente a “talvez”, “possivelmente”, “porventura”, “por hipótese”, “por acaso”. É este segundo uso o que pode causar alguma confusão.

A dica que vai ajudá-lo a não confundir uma coisa com a outra é lembrar que o advérbio “acaso” equivale à locução adverbial “por acaso”, podendo ser considerado uma redução desta, de modo que “acaso” é permutável por “por acaso”, enquanto “caso” é permutável por “se”.

É por isso que podemos dizer algo como “Se acaso me quiseres” (se porventura me quiseres), como fez Chico Buarque na sua bela canção Folhetim:

Se acaso me quiseres/ Sou dessas mulheres/ Que só dizem sim/ Por uma coisa à toa/ Uma noitada boa/ Um cinema, um botequim […]

No fragmento que suscitou a nossa refexão, o que cabia mesmo era “caso”:

Caso não encontre a edição em sua caixa de entrada, após confirmação da assinatura, procure lá.

Na voz de Gal Costa, Folhetim: https://www.youtube.com/watch?v=n8pBj706M3s

A Bela foto do Chico Buarque é de Fracisco Proner/ Reprod. CNN.

Publicado por Thais Nicoleti

Thaís Nicoleti é formada em português e linguística pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP e licenciada pela Faculdade de Educação da mesma universidade.

Um comentário em ““Caso” e “acaso”

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