Concordância do sujeito passivo

GRAMATICAIS. Sabemos que o verbo concorda em pessoa e número com o sujeito da oração, certo? É por isso que dizemos que ele ouviu e que eles ouviram alguma coisa. Essa flexão da forma verbal assinala a harmonia com o sujeito. Há casos, porém, em que, por não perceber qual é o sujeito da oração (uma questão de sintaxe), a pessoa não faz a concordância. Vejamos um exemplo de situação corriqueira:

Do ex-presidente só se ouviu promessas trabalhistas e a negação da privatização da Eletrobras, tema tão candente para o eleitorado. 

Extraído de um texto de um jornalista, o fragmento apresenta um desses casos de negligência da concordância verbal. A percepção de que o pronome “se” indetermina o sujeito leva muita gente a pensar que todo “se” tem essa função. Na verdade, não é bem assim.

Com os verbos transitivos diretos (como “ouvir”, já que alguém ouve alguma coisa), o “se” tem outra função. Ele transforma o objeto direto (a coisa ouvida) em sujeito. No exemplo acima, as promessas trabalhistas e a negação da privatização da Eletrobrás foram as coisas ouvidas no discurso do ex-presidente, as quais, nessa construção, têm a função de sujeito.  Poderíamos dizer que “só foram ouvidas promessas trabalhistas e a negação…”. Estamos diante de um sujeito passivo, ou seja, de um sujeito que sofre a ação expressa pelo verbo.

Se o redator tivesse optado pela estrutura analítica (“foram ouvidas”), certamente teria feito a concordância corretamente. O pronome “se”, empregado com os verbos transitivos diretos, integra uma estrutura em que o sujeito é passivo, mas o verbo mantém a forma ativa (ouviram-se promessas = promessas foram ouvidas). Assim:

Do ex-presidente só se ouviram promessas trabalhistas e a negação da privatização da Eletrobras, tema tão candente para o eleitorado. 

Publicado por Thais Nicoleti

Thaís Nicoleti é formada em português e linguística pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP e licenciada pela Faculdade de Educação da mesma universidade.

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